terça-feira, setembro 16, 2008

Hoje no DN




Na semana passada escrevi, nesta mesma coluna, sobre o Cáucaso, o conflito entre a Geórgia e a Rússia (estimulado pela NATO, braço armado dos Estados Unidos) aplacado in extremis pela União Europeia, que percebeu o perigo em que incorria se concretizasse as ameaças feitas. Invocar o regresso à "guerra fria" é um disparate, num mundo de novo multilateral e com diversos centros de poder...


Mais recentemente, Bush permitiu que as forças especiais americanas fizessem incursões no Paquistão, intervindo a partir do Afeganistão, sem sequer avisar o Governo "aliado" do Paquistão. O objectivo era capturar os terroristas da Al-Qaeda e os talibãs nos seus santuários. O que, claro, não aconteceu. A NATO declarou - vá lá! - que as suas tropas não atravessariam a fronteira do Afeganistão, tanto mais que o chefe do Estado-Maior paquistanês, avisou, entretanto, que "o Exército defenderá toda a área da sua soberania"...


Noutra região do mundo - a América Latina -, os conflitos com os Estados Unidos também têm vindo a agudizar-se. Desde, pelo menos, o princípio do séc. XX que a América do Norte considera os seus vizinhos do Sul, incluindo os mexicanos, como seus tutelados, para não dizer "economicamente colonizados". Por isso, após a Segunda Guerra Mundial, a América do Norte interveio militarmente - e sem complexos - em inúmeros países das Caraíbas, da América Central e do Sul. Para tanto, instigada pelos teóricos da "escola de Chicago", promoveu por toda a região ditaduras militares, derrubando, directa ou indirectamente, as democracias existentes. Os casos da República Dominicana, da Guatemala, do Chile, da Argentina, da Nicarágua, pós-Somoza, do Brasil, para não falar da invasão da baía dos Porcos, em Cuba, e do bloqueio ao regime de Fidel Castro, ficaram tristemente célebres.Na década de oitenta do passado século, com o sucesso da Revolução dos Cravos e da transição democrática espanhola, que constituíram uma lição para os Estados Unidos, voltaram as democracias à América Latina, com o beneplácito americano, embora as ambições de tutela económica do grande vizinho do Norte continuassem. Contudo, com os atentados de 11 de Setembro de 2001, no início do primeiro mandato de Bush - fez agora sete anos -, as preocupações prioritárias da América do Norte passaram a ser a "guerra ao terrorismo", com as invasões do Afeganistão e do Iraque e a consequente desestabilização de toda a região do Médio Oriente, incluindo Israel e o agravamento do conflito com a Palestina. Assim, a América Latina passou a um segundo plano e as suas recentes democracias puderam, de algum modo, respirar e consolidar-se. Curiosamente, verificou-se, por via democrática e pacífica, o aprofundamento democrático em toda a região, autonomista, em relação à América do Norte e mais ou menos populista. Do Brasil ao Chile e à Argentina, da Venezuela, Nicarágua, Equador, Bolívia ao Paraguai, para só citar os exemplos mais expressivos. Bush parece ter acordado - ou sido alertado pela sineta dos interesses das grandes multinacionais - relativamente a países que procuram gerir os seus interesses, com independência, apoiados pelas populações indígenas, como a Bolívia, mesclados e ricos em petróleo, como a Venezuela. Em tempo de crise, isso gera apetites e invejas. O Brasil de Lula, país emergente, tem sido solidário com os seus vizinhos mais próximos. Daí a infeliz "guerra" de ameaças retóricas - e não só - que levou à expulsão recíproca dos embaixadores. Este facto torna a situação da região bastante explosiva. Quando compreenderá Bush que a sua era terminou e que o melhor para ele - e para a América - seria retirar-se, discretamente, e deixar que a poeira do esquecimento seja benéfica para ele...

1 comentário:

Inês disse...

Muito me espanta que tenha sido o bochechas a escrever este texto.

Só tenho um apontamento:

"Na década de oitenta do passado século, com o sucesso da Revolução dos Cravos e da transição democrática espanhola, que constituíram uma lição para os Estados Unidos, voltaram as democracias à América Latina(...)"

Lá estão os tugas com a mania que eles é que salvaram o Mundo. Esta frase parece-me um bocadinho redutora, não? Cada macaquinho no seu galhinho :P