Na última aula de Sueco a professora contou-me que tinha visto nas notícias a maior árvore de natal da Europa, montada pela 2a vez em Lisboa.
Sorri e tentei partilhar o entusiasmo dela a descrever a imensidão da árvore, mas não consegui.
Ela, que não sabe o que é sentir frio dentro de casa, não ter uma rede de esgotos decentes ou ver o prédio do lado em risco de cair, passeia pela sua cidade contemplando as iluminações de Natal, que são bonitas diga-se, mas modestas quando comparadas com as da minha cidade.
Aqui, dá-se uma importância grande ao Natal. Há lojas que praticamente só vendem decorações para esta época e nota-se que há um envolvimento popular no espírito, ou não fosse o Pai Natal originário da Lapónia (Finlandesa). No entanto, não se reflectem em tentativas de grandiosidade saloias como "a maior árvore da Europa" na cidade que tem falta de dinheiro (pelo menos o Carmona queixa-se!) para resolver questões básicas que afectam a sua população.
Pouco importa se a árvore é paga pelo banco A ou B. Ainda pior. Os bancos são os maiores beneficiados da crise no país (por causa dos sucessivos recursos ao crédito) e dos que menos impostos pagam. No fundo, cada um de nós contribui um pouco para aquela árvore (pelo menos os clientes do Millenium).
Porquê uma ostentação de riqueza (e saloice da grossa) numa cidade que tem tantos problemas com falta de dinheiro? Já não há pessoas a dormir nos respiradores do Martim Moniz? Já não há casas a ruir nas colinas? Já não há lixo pela calçada pombalina? Já há saneamento básico (a funcionar) e instalações eléctricas decentes nas partes velhas da cidade? Já demoliram a última barraca? O trânsito já deixou de ser caótico?
Não quero ser utópico e sei que os problemas não se resolvem com ou sem árvore, mas é uma simples questão de atitude.
É dar importância às aparências e deixar para segundo plano o que realmente importa. Se o Millenium quer fazer a árvore com os lucros que deveria deixar nos impostos, tudo bem. Que se transforme isso num caso de orgulho nacional, já acho mais preocupante.
A minha professora deve ter ficado a pensar que em Lisboa tudo são rosas e que a árvore é a "cereja no topo do bolo".
Claro que eu não tive coragem de lhe dizer que somos um povo que "come sardinha e arrota camarão", mas senti-me envergonhado.
Porque é que não transportamos esta mania das grandezas para as coisas que realmente marcam a diferença numa cidade, num povo e num país?
Algo do género:
"Lisboa, a cidade mais segura OU limpa OU confortável OU barata OU menos poluída OU com menos carros OU com menos acidentes OU com mais espectáculos OU mais verde OU qualquer coisa deste género, da Europa"
Claro que se passar pela P. do Comércio vou admirar a árvore (sangue luso, é sangue luso...), mas certamente não a divulgarei como uma proeza Nacional.
Não é que não goste do "acessório", mas acho que já é tempo de nos concentrarmos no "essencial".
7 comentários:
Coincidência de um raio. Tinha mesmo pensado fazer um post idêntico quando chegasse a casa. Agora até é mais fácil. Limito-me a colocar um link para o teu estamine :D
Pois no Porto não há nada disso, a árvore que foi colocada nos Aliados caiu com o temporal na semana passada. Além disso, o Sr. Rui Rio nunca iria permitir tal coisa: "Enquanto houver um pobre na cidade, não há financiamento da câmara para o teatro" arrotou um dia. Meses depois, relançou o grande prémio do Porto em carros antigos, gastou rios de dinheiro e não enriqueceu em nada a cidade. Coerências!
nunca a vi, nem sei se a vou ver...
Já agora, comunico-te que neste momento podes dizer que os tais cd's "já cá cantam" ;)
Beijinhos
Gostei muito do que li. Concordo plenamente contigo. Os portugueses vivem muito das aparências. É uma tristeza:-( Gostam de aparecer nos jornais e no guiness por isto ou por aquilo e esquecem-se de olhar para o próprio umbigo. Mas olha, eu sei de que falo, pode não haver dinheiro para pagar os salários mas para mostrar obra, os politicos nao resistem. Forçam as organizações a fazerem um esforço financeiro enorme e endividarem-se apenas para mostrar "obra" durante o mandato. Essas coisitas que referes, que aliás são coisas básicas, demoram tempo e não surtem o efeito mediático que uma grandissima arvore de Natal. Por vezes penso, afinal Portugal está na Europa, apenas geograficamente porque em muita coisa está no Terceiro Mundo, infelizmente:-(
é incrível, não é? Presumo que o excesso de luz seja para ofuscar os reais problemas diários, pelo menos durante a época do natal.
(de x em quando espreito o teu blog)
um beijinho também de longe de portugal (eua)
daniela
Concordando contigo quando dizes que vivemos de aparencias, neste caso discordo. Portugal devia vender cada vez mais e melhor aquilo que pode vender: Turismo. E iniciativas destas conseguem trazer pessoas a Portugal.
Ângela: Muitoooo obrigado :)
Rui: Turismo sim, mas de qualidade. Não aqueles pacotes baratos que trazem o turista pé-descalco aos montes :)
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