Eu acredito que numa janela temporal de 20 anos alguém no PCP olhará para um calendário e espalhará a boa nova: “Camaradas, estamos no séc XXI”.
Poderia ter comecado este texto com “gosto de utopias” mas é sempre bom florear a coisa.
De vez em quando penso em voltar a Portugal. Sinto saudades dos amigos, da família, do mar, do Sol e do caos. Até das conversas de café do “faco e aconteco mas agora não que vai dar o Glorioso”. O processo repete-se sempre que me esqueco que os Portas e os Varas também habitam a Lusitânia.
E o que faco nesses momentos de nostalgia? Expressoemprego.pt e toca a enviar CVs. Inevitavelmente chego sempre à mesma conclusão. Mudam-se os tempos mas não se mudam as mentalidades.
Uma das entrevistas que fiz foi particularmente elucidativa do estado da arte.
Um camarada explicava-me o quão maravilhosa era a empresa e como tinham projectos fascinantes na área da engenharia e mais não sei quê. Comecei a fazer perguntas. O que desenvolviam? Para que clientes? Qual era o mercado fora de Portugal? Que tipo de quadros recrutavam? Qual era o organigrama e por aí fora.
O nevoeiro foi-se afastando e ambos chegámos à conclusão que nada disso por ali acontecia. Eram simplesmente uma empresa de trabalho temporário. Colocam pessoas a custo reduzido em multinacionais e, ao que parece, chamam-lhe “consultoria”. Muito bem.
Fase seguinte, apertar o camarada até ele me dizer qual é a empresa que realmente me iria empregar. Surpresa das supresas, a Siemens. Ando a tropecar nestes gajos há 7 anos…
Comeca o ró-nhó-nhó do costume e a tentativa de baixar o salário por uma suposta falta de experiência em telecomunicacões. Esclareco que o meu curso superior foi tirado na especialidade de telecomunicacões. E ele continua…tudo em nome do lucro pelo baixo salário.
Tento explicar que aquela abordagem está errada. Um engenheiro não é um gajo que carimba impressos. É uma pessoa com formacão técnica em diversas áreas e que tanto pode fazer um projecto para uma antena como estar a desenvolver SW para um dos submarinos do Portas. O conceito “tens que fazer a mesma coisa a vida toda e se mudas uma virgula voltas para o salário dos 20 anos” já não é apenas um erro, é uma aberracão.
Mas alinhei no esquema. Sim senhor, vamos a isso. E comecei a perguntar para que área dentro das telecomunicacões iria esta pessoa. Planeamento celular? Programacão de estacões base? Sw para telemoveis? O que me responde ele? Pois…isso já não sei porque sou de gestão.
Respirei fundo e perguntei: “Então como é que pode querer avaliar os meus conhecimentos técnicos e em virtude disso baixar o salário, se nem sabe do que estamos a falar?”
Ao fim de 1h de conversa estávamos a falar da vida e ele a perguntar-me quais eram as condicões de trabalho na Suécia.
“Projectos”, “Inovacão”, “Consultoria”, “IT”, “Excelência”.
Epá…deixem-se de merdas e de sites pomposos com frases vazias.
É trabalho temporário e mal pago. Ponto final.
Não há que ter vergonha. É o mercado que temos, tudo bem.
Mas por amor da santa...não tentem dourar a pílula com toques de gestor chico-esperto.
E pronto…lá se foi a utopia.
Depois do verão há mais.
1 comentário:
Somos uns tristes arrogantes, é o que é.
Um abraço
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