A fogueira das vaidades

Gosto de uma boa comédia. Ao Sábado e de preferência quando tenho o cérebro em modo “frito”. Um daqueles filmes com o Adam Sandler ou Matthew Mcconaughey e uma das louras-todas-iguais-que-nunca-se-percebe-a-diferenca. No fim todos ficam felizes enquanto a imagem se afasta no céu do Central Park. E isto é particularmente espectacular porquê? Porque permite ver o filme, dormir, acordar e ficar com aquela sensacão de entertenimento. Agora…se estivermos bem acordados isto pode tornar-se particularmente doloroso.
E é aqui que comeca o problema.
Na passada quarta-feira consegui apanhar as últimas horas do debate na AR (RTP e o servico publico via internet = uma aplicacão decente para os impostos ) e, para mal dos meus pecados, estava bastante acordado. O teatro foi mauzito.
Por onde comecar? Tantos e bons momentos.
Talvez Manuela Ferreira Leite que continua em grande forma. Na sua intervencão disse que não estava para “politiquices” ou seja, não estava para apresentar alternativas ao PEC IV. E essa foi a posicão do PSD. Votaram contra o PEC IV, sem que explicassem porquê e muito menos sem apresentar qualquer alternativa. E esta “equipa” será a próxima a governar o país. Portanto…promete. É claro que todos perceberam que o PSD vai aplicar exactamente as mesmas medidas que o PS, como tal, nada havia para criticar. O voto contra deve-se única e exclusivamente a uma impaciência pelo poder. É um erro politico do tamanho do farol de Alexandria mas também por aqui se percebe que tipo de alternativa existe em Portugal.
Apreciei também a intervencão final do CDS. Não me lembro do nome do camarada mas foi aquele betinho com aspecto de sub-nutrido do Burkina Faso. Todo o discurso foi direccionado para a campanha que se avizinha. Dizia ele que é tempo de cortar com os projectos megalómanos. Nada de TGV, aeroporto e coisas do género e toca de canalizar dinheiro para pensões dos velhos. Eu estava a contar os segundos para ouvir “submarinos” mas não aconteceu. Lá torneou aquilo sem ter que falar no despesismo do chefe. E atencão à agenda do CDS (ou seja a do Paulo Portas). Em pleno congresso, depois do abraco e choradinho, Portas disse alto e bom som que “é agora ou nunca!”. Portas vai atirar-se ao PSD e tentar os 10% para se intrometer na equipa do governo. Onde é que já vi isto? Pela direita temos um futuro radioso.
E pela esquerda? BE e PCP disseram o óbvio (não se pode cortar em nada) e impossível de concretizar. Como nunca serão governo podem dizer o que quiserem. Por outro lado, se as sugestões do BE ou PCP fossem aplicadas seríamos pura e simplesmente corridos da UE. Ou seja, alternativa de esquerda também não há.
Apesar da pobreza das intervencões, foram Jerónimo de Sousa e a camarada dos verdes qua ainda lancaram algum valor no debate. Uma espécie de regresso ao passado. É necessário voltar a produzir e parar com esta dependência das importacões. Eu diria que é imperativo voltar para os campos e pelo menos produzir aquilo que comemos. É claramente uma das formas de comecar a reduzir a dívida externa.
Outro dos tiros certeiros de Jerónimo foi o sempre evitado assunto da banca. Disse, e com razão, que o PS não teve coragem de enfrentar a banca e de tributar as grandes fortunas. É um facto. Ninguém tem coragem de enfrentar quem na prática controla o país. O PS não o fez e é uma crítica justíssima.
Aliás…é essa a maior falha deste governo. Não ter coragem de ir tributar à clientela mais dificil. Outro dos erros de palmatória dos governos Sócrates foi não conseguir acabar com a política de tachos para os boys. Um partido que tem Lellos e Varas, gestores que trocam cargos de ministro das obras públicas por lugares na administracão de construtoras, contratos ruinosos nas parcerias publico-privadas e coisas do género, dificilmente poderá ser uma opcão válida.
Mas…existe melhor? O PSD repete a dose com os Loureiros, Cavacos, Santanas, Barrosos, BPNs, Ferreiras do Amaral e outros que tal.
Eu acho Sócrates uma pessoa válida e considero que a equipa governamental tem muita gente de qualidade. Acho no entanto que a família PS já não é tão recomendável. Tal como a família PSD. As teias da corrupcão são enormes e complexas. Não há D. Sebastião que consiga sozinho romper.
O problema é por isso grave e as escolha resume-se ao mal menor. Estaríamos numa situacão diferente com um governo PSD? Sim, provavelmente pior.
Deram-se ao trabalho de analisar a oposicão do PSD desde 2005? Passaram o tempo a contrariar toda e qualquer tentativa de reforma em nome dos votos. Até na rua desfilaram ao lado da CGTP e do Mário Nogueira. Foram uma constante forca de bloqueio preocupados apenas com o assalto ao poder (e respectivos tachos) sem nunca apresentar quaquer alternativa válida. Nesse aspecto são coerentes e continuam perfeitamente indiferentes com as reais necessidades do país.
E o que dizer do discurso final de Francisco Assis? Depois de o ouvir quase que acreditei que o PS estava muito chateado com a queda do governo. Sócrates também disfarcou bem em directo às 20h. Pareciam todos muito aborrecidos…
Na verdade as eleicões antecipadas são o melhor que pode acontecer ao actual governo. Entalados pelos credores e por uma oposicão sem sentido de Estado, há que puxá-los para a fogueira e mostrar a evidência: não há alternativa melhor.
Passos Coelho escreveu no seu livro que não aumentaria impostos. Ontem em Bruxelas já disse que sim. Este rapazito está tão preparado para ser PM como eu. Precipitou-se, cedeu às pressões dos barões e agora tem que se chegar à frente. No actual cenário deu a Sócrates uma hipótese de disputar eleicões em condicões muito melhores.
A não ser que a campanha eleitoral traga um mar de surpresas, o meu voto está decidido.