terça-feira, fevereiro 15, 2011

No divã


Ofereceram-me este livro. Um cabo dos trabalhos...
Passei os olhos na primeira página e só consegui parar quando vi a última. A razão? Muito simples...o livro sou eu. Ou pelo menos representa o que eu gostava de ser.
O Goncalo Cadilhe pega em 20 anos de mochila às costas e escreve um manual, que mais do que ensinar a viajar, explica uma opcão de vida.
Há uma distincão importante que me parece fazer todo o sentido: o turista e o viajante. O turista vai para determinado destino esperando encontrar o mesmo que tem em casa. O conforto, a comida, a rotina. Vai e volta sem nada acrescentar ao que conhece. O exemplo que me lembro assim de repente são as estâncias turisticas na Tailândia feitas por e para suecos. O café é sueco, o instrutor de mergulho é sueco, a rapariga que toma conta dos putos é sueca. Um enclave com vista para o Índico. O viajante vai para um destino para conhecer. A comida local, a realidade de quem lá vive, a paisagem que ninguém teve que construir. O que motiva o viajante é essencialmente a curiosidade.
Mais do que as dicas de viagem, o que realmente me impressionou e de certa forma me prendeu, foram os vários relatos dos porquês na primeira pessoa. Pessoas com empregos estáveis, familia, amigos, vida social e todos os "standards" normalmente impostos e aceites. Sobra a curiosidade, aquela enorme vontade de conhecer. Para quem a tem, a tal curiosidade, o medo maior é de ver a vida passar e algures nesse percurso perceber que já não há hipótese de cumprir o sonho. E como um sonho não realizado pode ser um angustiante e constantemente presente pesadelo.
Histórias de pessoas que abandonaram o "certo e seguro ao fim do mês" para viverem de uma forma pouco convencional mas, a julgar pelos relatos, mais feliz.
E depois...uma parte interessante...o "porque não?". Gostei particularmente da comparacão de custos. Conclusão: é mais caro estar em Portugal do que correr o mundo. As razões? Comprem o livro.
Mas, pela minha experiência, posso confirmá-lo em parte. 3 semanas de férias em Portugal custaram quase o mesmo que 3 semanas na Tanzânia, com safari, subida ao Kilimanjaro e praia em Zanzibar incluídos...
Portugal é hoje em dia um destino caro.
Para algumas destas pessoas, o impulso final foi uma desgraca...o familiar que trabalhou a vida toda para gozar a reforma e ver um pouco do mundo mas que foi levado por um cancro, um despedimento depois de anos de trabalho árduo, etc. Ver uma vida interrompida dá a imediata sensacão de que não há mais tempo a perder.
Leio estes relatos e tenho uma imensa vontade de me fazer à estrada. Revejo-me em tudo. No emprego estável, no dinheiro ao fim do mês, nos amigos, na família. É suficiente? Lamento, mas não.
A curiosidade faz-me passar o tempo a ler sobre sítios que mal consigo apontar no mapa ou a comprar Lonely Planets. O skyscanner.net é o meu google e o booking.com a minha remax.
Todos os dias, sem excepcão, eu penso, imagino e traco um percurso. Sao Francisco até Vancouver de carro. Miami até Nova Orleães nos comboios da Amtrak. Havana até Panamá City com a Copa Air. Singapura até Kuala Lumpur. Sydney até Melbourne. Ferry para a Tasmânia. Buenos Aires para Montevideo de barco. São só 3 horas. Santiago para La Paz. O deserto do sal.
O trilho dos Incas. A lagoa azul de Malta. As praias desertas de São Tomé. As dunas da Namíbia. O norte de Mocambique. O mais afamado snorkeling do mundo em Bonaire. A polinésia francesa. Tudo com datas e precos. Tudo tão perto e ao mesmo tempo tão longe. Um loop mental que dura desde o minuto que acordo até ao minuto em que adormeco.
E porque não? Pergunto-me todos os dias: "porque não?". Quanto tempo mais vou adiar e fingir que não importa?
A vida não pode ser só trabalhar e ganhar dinheiro para pagar contas. A sério...não pode.

3 comentários:

Helena Barreta disse...

Também eu tenho esse sonho, correr mundo.

Não sendo eu invejosa, olho para os que partem, para os que não adiam os sonhos e gabo-lhes a coragem de ir, por vezes sem destino bem definido.

Nuno disse...

Tiago,
O primeiro livro que li do Gonçalo chama-se Planisfério Pessoal. São as suas crónicas de 17 meses de viagem onde deu a volta ao mundo por terra e mar. O sentimento que me corria na alma, está transcrito nas tuas palavras que acabei de ler. Onde estou eu hoje? Exactamente no mesmo sítio, a redigir este pequeno comentário e nada faço para seguir outro rumo! Sou feliz assim? Sou. Seria feliz de outra forma? Não sei, mas gostaria de exprimentar!

Vasco disse...

Ha 8 anos tirei 6 meses de licenca sem vencimento e fui de mochila 'as costas para o Sudeste Asiatico (Tailandia, Birmania, Laos, Vietnam, Cambodja, Malasia, Singapura).

Das melhores coisas que fiz na vida.