CêNêNê

A CNN tem um, entre vários defeitos, que particularmente me enerva: existe.

Sendo um canal de notícias 24h (36 no caso deles), precisam de acontecimentos como do pão para a boca. Quando o mundo está calmo, fabricam qualquer coisa na Virginia, quando está a ferro e fogo, espremem o limão até à náusea.

Sim, tenho andado a seguir a crise do Egipto/Tunisia/Jordânia/Carolina do Norte através da CNN. Goste ou não, a verdade é que há 15 dias que não falam de outra coisa, pelo que, chegue a que horas chegar a casa, há sempre sangue fresco.

Um gajo é baleado. Um expert em assuntos do médio oriente fala no estúdio. Um repórter no local fala com populares. Outro repórter em Nova Iorque fala com manifestantes em frente à sede das NU. Há uma ligacão em directo para a fábrica da Magnum (não é a dos gelados) onde um engenheiro com óculos fundo de garrafa explica até onde a bala furou os intestinos do homem. A imagem é repetida 200 vezes enquanto em rodapé aparece uma nova calinada da Palin. Ao fim de 5 horas de discussão sobre a bala, chega um novo expert e voltam ao tema principal: o Mubarak. "Sai ou não sai?", pergunta a Moura Guedes de servico. O expert puxa da caneta e, numa mapa gigante, aponta para o Cairo e Alexandria. Nesta altura os texanos percebem que aquilo fica em áfrica e mudam para o super bowl. O expert divaga sobre o facto de o exército ser determinante no xadrez e diz que Mubarak tem que alimentar as chefias. Ao fim de 30 minutos não chegou a qualquer conclusão porque, tal como o espectador, ele só sabe o que a CNN mostra. Mas, e isto é o que realmente conta, o enchimento de chouricos está garantido enquanto no Cairo todos dormem. Tudo com luzes, movimento e letras bem gordas.
Depois entra o enviado do Obama em directo. Sim, o Obama mandou um gajo qualquer para a região para falar por ele. Entre várias pérolas diz que exigiu a Mubarak uma lista com datas exactas para a execucão de novas reformas. Certo. Nas ruas há guerra civil e os EUA querem uma tabela excel.
Parece que estou a ver...os dois sentados no pátio, bebericando um martini e apreciando lá ao longe o nariz da esfinge (que segundo Panoramix era muito belo). O silêncio é interrompido pelo americano (não me recordo do nome mas aposto que é Bob ou Joe) que diz: "Mubi, o granel já chegou ao Capitólio...não podemos continuar a mandar aqueles milhões todos os anos para vocês estarem quietos enquanto Israel chapa massa no muro se não me arranjares uma conferência de imprensa a dizer qualquer coisa de jeito. Faz lá uma lista em excel com 5 ou 6 accões para acalmar as massas. Metes umas datas nisso, envias para o meu mail e eu faco fw para o Obama. Se ele concordar, fazes um power point e apresentas isso na abertura de um telejornal qualquer. O povo fica contente, nós tiramos a CNN daqui e podes continuar a arrear castanhada, comecando pela oposicão. Mas sê discreto e já sabes, deixa lá o Sinai."
É no fundo a diplomacia ao seu mais alto nível. Uma tabela excel, algumas accões e prazos de execucão.
O enviado do Obama desliga o telefone e vai dar umas bracadas no palácio do Mubarak. A emissão continua no estúdio com mais um especialista, desta vez, o melhor do mundo em tabelas excel.