quarta-feira, maio 12, 2010

A águia

Este ano a lógica imperou no campeonato de futebol. Ganhou a equipa com melhores jogadores, melhor treinador, que melhor futebol praticou e, se me permitem, com os melhores adeptos.
Pode até parecer que escrevo algo com sentido mas para quem tem memória, sabe que as coisas não são bem assim. Mourinhos, Azevedos, Pringles e Damásios à parte, lembro-me de ver equipas com Valdo, Thern e Ricardo Gomes perderem campeonatos contra Vlks, Bandeirinhas e Secretários. Mas enfim, parece que este ano a coisa se limitou ao clássico quem marca mais golos ganha.
Acho que a primeira coisa a dizer é que esta vitória é limpa, sem espinhas e não merece qualquer contestacão. O benfica não foi melhor (isso não chegaria para vencer este campeonato), foi muito melhor do que os seus adversários. Foi uma época extraordinária. Não só no que a resultados diz respeito, mas também (e principalmente), no reencontro com o prazer de ver a equipa jogar. Correm, lutam, acreditam. Embalam o público.
Fizeram 76 em 90 pontos possíveis. Marcaram mais de 100 golos em todas as competicões. Não fosse a liga europa (choro só de ver a final entre o sporting de Madrid e a décima equipa de Londres) e teria sido uma época de sonho. Não foi uma vitória de uma cidade, de uma região, nem sequer de um país. O efeito "Marquês do Pombal" aconteceu um pouco por todo o mundo. De Maputo a Caracas, de Zurique a Luanda, de Newark a Paris. É isso que nos torna diferentes, é isso que provavelmente nos faz ser o maior clube do mundo.
É também no momento de vencer, no nosso caso, de "cumprir o destino", que mostramos elevacão. O discurso dos dirigentes, do treinador, dos jogadores. Não é de ódio, não é contra ninguém. É por nós, é pelo Benfica. É o nome do clube que se ouve no estádio. Ninguém grita o nome dos adversários, ninguém se lembra sequer que eles existem. Isto meus amigos, não é só ser diferente, é ter a nocão de quem faz sombra e de quem vive nessa sombra.
Para mim há um gostinho especial neste título. Numa época em que a equipa era claramente favorita, por razões que sinceramente não percebo, os principais adversários fizeram uma sagrada alianca de vale-tudo desde que não fosse o Benfica o campeão. Foi patético ver o Sportém neste papel e foi quase imoral assistir aos empurrões dados ao Braga no último terco da época quando perceberam que este era o único barco que ainda não tinha ido ao fundo. É por isso particularmente agradável ouvir Domingos Choramingas, com aquela cara de quem acabou de chupar um limão, desfazer-se em desculpas de mau perdedor. É até caricato ouvi-lo queixar-de uma falta marcada no jogo entre o guimarães e o benfica (falta que existiu), para justificar a nossa vitória nesse jogo. Como? Falta contra o guimarães? O mesmo guimarães que perdeu em Braga com 3 penáltis cavados, 4 expulsões e 115 minutos de jogo? Enfim...Choramingas é apenas o espantalho de servico nesta ocasião. Está a ser usado, tal como o Braga (clube com o qual sempre simpatizei por acaso...). Não vale a pena dar-lhe mais importância do que ele realmente tem.
Leio também, aqui e ali, algumas linhas cheias de azia. Há quem teime em não reconhecer mérito e prefira comecar a construir mitos, transformando túneis onde o Cardozo foi agredido e expulso ou onde o Hulk fez uma espera a árbitros como algo que manifestamente nos beneficiou. Enfim...cada um se convence daquilo que quer, consoante o tipo de azedume. Há imagens e provas. Não vale a pena gastar mais latim.
A Nacão está contente e durante alguns dias até nos esquecemos que estamos na bancarrota.
Desde Rui Costa, João Pinto, Isaias e Paneira que não tinha tanto gosto em ver uma equipa envergar o manto sagrado. Marcelos, Tahars e Paredões parecem definitivamente ter ficado numa página da história que convém esquecer depressa.
Entre todas as pérolas que desfilaram na Luz, uma brilhou mais, pelo menos para mim, e foi o David Luiz. Joga com raca e classe. Sabe sair com a bola nos pés e está longe, muito longe do típico central bate-na-avó. E depois, aquele pequeno detalhe que emociona, é que parece gostar do clube. Estarei a ser ingénuo certamente, mas se não gosta, disfarca bem. Honra seja feita a quem não o dispensou depois de mais um ano de estaleiro...
É tempo também de comer as minhas palavras. Fui um dos que nunca quis Jesus no Benfica (o da Amadora e o da Nazaré). Não gostava do estilo, nem do discurso. Especialmente depois da "playstation" e de outros mimos que disse aquando da visita do braga à Luz. Mas enfim...estilos à parte, rendo-me ao treinador. Sabe motivar os jogadores, sabe aproveitar as suas potencialidades (vejam David Luiz, Di Maria, Coentrão, Aimar, Saviola e Cardozo) e sabe ler o jogo. Foi o homem certo no momento certo.
Agora, a longa e dolorosa espera até Agosto. Pelo meio a seleccão de Queiroz que alguns teimam em dizer que é de todos nós (esse assunto fica para mais tarde que agora estou bem disposto).
Espero que este título seja o início de qualquer coisa. Sinceramente acredito que os quinhentinhos, frutas, cafés com leite e viagens ao Brasil tenham os dias contados. O que é diferente de dizer que já não existem, note-se. O homem já passou dos 70, não é agora que se vai endireitar...
Ficam os números e as exibicões. Golos e mais golos. Estádios cheios. Uma época para recordar. O trigésimo segundo título de campeão nacional de uma história já centenária.
Agora, cumpram o vosso destino e tragam lá o trigésimo terceiro.

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