" Um colega meu que trabalha no Porto ficou horrorizado quando soube que outro colega do dito local tinha ido à Festa do Avante. Como era possível um jovem nascido depois do 25 de Abril apreciar tal evento? Porque não? (perguntou alguém) Porque só quem lá vai são os comunistas!!! Respondeu indignado o tal colega. Isto passou-se há um ano e os intervenientes têm idades de 54 e 31 anos. Este é apenas um exemplo que eu conheço, mas devem haver milhares de situações idênticas, pois continuamos a ter pessoas que se deixaram embalar pela acção psicológica que durante anos o regime salazarento foi divulgando. Apesar de tudo, não há registo de que os comunistas tenham comido criancinhas ao pequeno-almoço. A realização da festa do Avante sempre foi de uma ou de outra forma, vista de esguelha por quem domina o poder. Mesmo assim, contra ventos e marés nunca conseguiram evitar que ela se efectuasse. Quanto mais dificuldades, melhor. Esta Festa começou nas antigas instalações da FIL, passou depois para o Alto da Ajuda, onde hoje estão as instalações universitárias de Arquitectura, de seguida foi para Loures, para finalmente se instalar na Atalaia, Seixal, em terreno adquirido para o efeito. A minha ida à Festa do Avante passa obrigatóriamente por ouvir alguns concertos, para além dum grupo coral alentejano, comer ensopado de borrego acompanhado por um bom tinto alentejano, comprar livros e no Domingo à tarde ouvir os discursos de encerramento que, funcionam um pouco, para mim, como um elixir da esperança. Todos os anos, quando chega o momento de cantar a Internacional, convenço-me que nem tudo está perdido, que ainda há uma esperança, que isto vai mudar, que não estou só, que afinal talvez não seja uma Utopia. Foi lá que há um bom par de anos ouvi pela primeira vez o Chico Buarque com o MPB4, denunciando as atrocidades cometidas pelo regime militar instalado no Brasil. Foi lá que também tomei consciência dos conflitos dos Bascos e dos Irlandeses. Guardo com enorme saudade o concerto dado pelos cantores de intervenção que antes do 25 de Abril tiveram a coragem de se opor ao regime utilizando a cantiga de protesto como arma: Zeca Afonso, Adriano Correia de Oliveira, Padre Fanhais, Fausto, José Jorge Letria, Sérgio Godinho, José Mário Branco, Paulo de Carvalho, Fernando Tordo, Carlos do Carmo, e outros que agora não me ocorre. Ary dos Santos, outro nome que era presença constante e que sempre me arrepiava quando declamava, tal era a força das suas palavras. A Festa do Avante é um local de convívio onde sempre encontro alguém que já não via há algum tempo. Se quiser encontrar amigos açorianos, basta, a partir do fim de tarde, aparecer no pavilhão dos Açores na mudança de cada hora. Se não houver ninguém na primeira hora, é uma questão de insistir, porque vai aparecer alguém. Nunca falhou. Depois, matam-se saudades, comem-se umas sopas de império e bebe-se um vinho de cheiro. Este ano lá estarei mais uma vez a cumprir o ritual. Está aberta a todos, anda-se com segurança, divertimo-nos, tem bons espectáculos, os livros são acessíveis, a comida regional é agradável, o ambiente é descontraído e não dão injecções atrás da orelha. Ninguém faz uma festa assim. "
João Franco
1 comentário:
O comentário era bom demais :)
Resolvi colocá-lo como texto!!
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