Durante a campanha para as presidenciais, Aníbal de Boliqueime, deixou escapar uma calinada que ficará para a história. Ele, a figura máxima do Estado Português, quando abordado por uma senhora na rua que lhe dizia que nem dinheiro tinha para comer, sugeriu à mesma que fosse a uma instituicão de solidariedade que não fosse do Estado. Meter dinheiro em bancos onde ele tem amigos e juros de 140% ainda vá agora dar sopa a um desgracado, isso é que não. Prioridades.
Julgo contudo que este episódio infeliz não é mais do que isso, um episódio infeliz. Cavaco não estava preparado para responder a perguntas óbvias (como por exemplo as do BPN) quanto mais para improvisar no meio da rua. Nem sequer é sobre o Cavaco que me apetece escrever.
Aliás, se tudo correr bem, vou passar os próximos 5 anos com a mesma exclamacão de cada vez que o vir num noticiário: "Já não me lembrava que este gajo é o nosso presidente!!"
É a solidariedade que me traz aqui.
Há uns meses atrás, naquela altura em que o Pedro Passos Coelho fazia um discurso todos os dias, consegui, entre a cacofonia reinante, reter uma frase. Disse ele "é altura de contarmos com a solidariedade do próximo". Mais palavra, menos palavra, a mensagem era esta. O Estado demite-se das suas funcões sociais. Seja qual for o PM - aliás, para os próximos anos essa será apenas uma figura decorativa - o Estado vai ter que reduzir ou cortar nas prestacões sociais. A "solidariedade do próximo" é uma forma suave de dizer "orientem-se".
Não há muito a fazer, mas há algo a criticar. Os cortes, necessários há mais de duas décadas, vão ser feitos da noite para o dia. A forma como são feitos é que deve ser realcada. São apenas aqueles que não têm forma de fugir que vão ser apanhados. Os mais pobres ou a classe média que trabalha por conta de outrém. Para as classes mais altas, comecando pela classe política que devia ser um exemplo, os regimes de excepcão sucedem-se.
E, já agora, desde quando é que a "solidariedade" que não "a do próximo" existiu? Pelo menos para a minha geracão, apesar de tudo, a geracão mais qualificada de Portugal, o que é que o Estado Português fez nos últimos 20 anos?
Que me lembre, assim de repente, recordo N universidades privadas com autorizacão de funcionamento, com cursos tão necessários no mercado de trabalho como uma picareta no oceano. Milhares de alunos a rebentarem orcamentos familiares para serem "doutores" (ainda hoje não percebem que um gajo não é doutor só porque tira um curso superior). Os que resolveram ir para cursos com saída profissional, sujeitam-se a tudo em nome de um emprego. Não há horário, não há limite para nada. Há que agarrar a oportunidade com unhas e dentes. Os salários são uma merda, sim, não são uma miséria, nós estamos há 20 anos na UE e por isso a palavra está correcta. São uma MERDA!
Sair de casa dos pais é uma aventura e só acontece lá para os 30. Filhos? Quem sabe um. Com a creche a custar mais de 300 euro, uma casa a chegar facilmente aos 500 euro e os salários a olharem por baixo para os 1000 euro, como é que é possível? Com a ajuda dos pais que vão aguentando o barco até mais tarde, com a ajuda desses mesmos pais que entretanto são avós e ficam com os putos e por aí fora. Ora, isto é exactamente a solidariedade do próximo. O que é que muda agora? O próximo tem um bocado menos de dinheiro todos os meses, é só isso.
Nem todos passam por aqui. Há ainda, felizmente, profissões que têm muita saída em Portugal e que permitem vidas dignas deste Continente a muita gente. Mas convenhamos...não temos que ser todos engenheiros civis, economistas, médicos ou diplomatas.
A aposta na Educacão, aquela que verdadeiramente interessa e que pode mudar um país, foi uma aposta falhada. Por todos. Desde o Oliveira rapa tacho até ao actual Primeiro Ministro. Foi José Sócrates o primero que realmente tentou reformar a Educacão em Portugal mas, nem com maioria no Parlamento conseguiu. A oposicão (com PSD à cabeca) fez tudo o que conseguiu para encravar o processo e sacar o máximo número de votos. O interesse nacional vem depois. Por aqui também se vê o que virá com Passos Coelho ao leme.
Sinceramente não consigo culpar J. Sócrates pelo actual estado do país. Errou e muito, mas não me parece que qualquer outro tivesse feito melhor. Acho até que outro qualquer teria tentado menos...
Leio que os conservadores (partido de Merkel) estão interessados em apanhar mão-de-obra qualificada da Iberia para preencher as vagas que o mercado de trabalho alemão cria. Faz todo o sentido. Brancos, baratinhos e qualificados. Os turcos podem esperar. A realidade é muito mais bonita nos filmes.
Quem pode criticar os alemães? Tentam construir a sociedade que mais lhes interessa. E quem pode criticar um português ou um espanhol por procurar melhores condicões de vida?
De uma forma ou de outra, nós, enquanto país, ficaremos sempre a perder. Sem Educacão não existe conhecimento, sem conhecimento não existe a possibilidade de criar, desenvolver e produzir. Sem a possibilidade de produzir não temos nada para trocar no comércio global, sem trocas não há dinheiro, sem dinheiro não há riqueza criada. Sobra o crédito. Ao fim de 30 anos chegamos ao estado actual. É simples.
Voltando ao início...quando Passos Coelho diz que é tempo de receber solidariedade do próximo, a pergunta que se impõe é: "Camarada, onde andaste nos últimos 20 anos?"
Julgo contudo que este episódio infeliz não é mais do que isso, um episódio infeliz. Cavaco não estava preparado para responder a perguntas óbvias (como por exemplo as do BPN) quanto mais para improvisar no meio da rua. Nem sequer é sobre o Cavaco que me apetece escrever.
Aliás, se tudo correr bem, vou passar os próximos 5 anos com a mesma exclamacão de cada vez que o vir num noticiário: "Já não me lembrava que este gajo é o nosso presidente!!"
É a solidariedade que me traz aqui.
Há uns meses atrás, naquela altura em que o Pedro Passos Coelho fazia um discurso todos os dias, consegui, entre a cacofonia reinante, reter uma frase. Disse ele "é altura de contarmos com a solidariedade do próximo". Mais palavra, menos palavra, a mensagem era esta. O Estado demite-se das suas funcões sociais. Seja qual for o PM - aliás, para os próximos anos essa será apenas uma figura decorativa - o Estado vai ter que reduzir ou cortar nas prestacões sociais. A "solidariedade do próximo" é uma forma suave de dizer "orientem-se".
Não há muito a fazer, mas há algo a criticar. Os cortes, necessários há mais de duas décadas, vão ser feitos da noite para o dia. A forma como são feitos é que deve ser realcada. São apenas aqueles que não têm forma de fugir que vão ser apanhados. Os mais pobres ou a classe média que trabalha por conta de outrém. Para as classes mais altas, comecando pela classe política que devia ser um exemplo, os regimes de excepcão sucedem-se.
E, já agora, desde quando é que a "solidariedade" que não "a do próximo" existiu? Pelo menos para a minha geracão, apesar de tudo, a geracão mais qualificada de Portugal, o que é que o Estado Português fez nos últimos 20 anos?
Que me lembre, assim de repente, recordo N universidades privadas com autorizacão de funcionamento, com cursos tão necessários no mercado de trabalho como uma picareta no oceano. Milhares de alunos a rebentarem orcamentos familiares para serem "doutores" (ainda hoje não percebem que um gajo não é doutor só porque tira um curso superior). Os que resolveram ir para cursos com saída profissional, sujeitam-se a tudo em nome de um emprego. Não há horário, não há limite para nada. Há que agarrar a oportunidade com unhas e dentes. Os salários são uma merda, sim, não são uma miséria, nós estamos há 20 anos na UE e por isso a palavra está correcta. São uma MERDA!
Sair de casa dos pais é uma aventura e só acontece lá para os 30. Filhos? Quem sabe um. Com a creche a custar mais de 300 euro, uma casa a chegar facilmente aos 500 euro e os salários a olharem por baixo para os 1000 euro, como é que é possível? Com a ajuda dos pais que vão aguentando o barco até mais tarde, com a ajuda desses mesmos pais que entretanto são avós e ficam com os putos e por aí fora. Ora, isto é exactamente a solidariedade do próximo. O que é que muda agora? O próximo tem um bocado menos de dinheiro todos os meses, é só isso.
Nem todos passam por aqui. Há ainda, felizmente, profissões que têm muita saída em Portugal e que permitem vidas dignas deste Continente a muita gente. Mas convenhamos...não temos que ser todos engenheiros civis, economistas, médicos ou diplomatas.
A aposta na Educacão, aquela que verdadeiramente interessa e que pode mudar um país, foi uma aposta falhada. Por todos. Desde o Oliveira rapa tacho até ao actual Primeiro Ministro. Foi José Sócrates o primero que realmente tentou reformar a Educacão em Portugal mas, nem com maioria no Parlamento conseguiu. A oposicão (com PSD à cabeca) fez tudo o que conseguiu para encravar o processo e sacar o máximo número de votos. O interesse nacional vem depois. Por aqui também se vê o que virá com Passos Coelho ao leme.
Sinceramente não consigo culpar J. Sócrates pelo actual estado do país. Errou e muito, mas não me parece que qualquer outro tivesse feito melhor. Acho até que outro qualquer teria tentado menos...
Leio que os conservadores (partido de Merkel) estão interessados em apanhar mão-de-obra qualificada da Iberia para preencher as vagas que o mercado de trabalho alemão cria. Faz todo o sentido. Brancos, baratinhos e qualificados. Os turcos podem esperar. A realidade é muito mais bonita nos filmes.
Quem pode criticar os alemães? Tentam construir a sociedade que mais lhes interessa. E quem pode criticar um português ou um espanhol por procurar melhores condicões de vida?
De uma forma ou de outra, nós, enquanto país, ficaremos sempre a perder. Sem Educacão não existe conhecimento, sem conhecimento não existe a possibilidade de criar, desenvolver e produzir. Sem a possibilidade de produzir não temos nada para trocar no comércio global, sem trocas não há dinheiro, sem dinheiro não há riqueza criada. Sobra o crédito. Ao fim de 30 anos chegamos ao estado actual. É simples.
Voltando ao início...quando Passos Coelho diz que é tempo de receber solidariedade do próximo, a pergunta que se impõe é: "Camarada, onde andaste nos últimos 20 anos?"
2 comentários:
Não te leio há muito. Não sei se ainda continuas na Suécia com a tua familia ou se já estarás por terras lusas. O que é certo é que consegues ter uma ideia mais lúcida e mais realista estando fora (se for o caso) do que muitos que cá estão dentro.
Nunca senti este País tão no fundo como hoje.
E o pior é que não vejo ninguém preocupado com o assunto.
Sofia - 33 anos
LX
No frio até que a voz me doa :)
tf
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