Durante décadas, nós, Seres Humanos com tendência capilar na zona da baixa bochecha, fomos afastados da tela da criacão, mais conhecida entre mundanos por "fogão".
Responsabilidade maior da outra variante humana neste capítulo das artes, que nunca quis partilhar o Graal da sapiência.
Na clandestinidade trocámos receitas, adquirimos conhecimentos e partilhámos experiências. Quem não passou bilhetinhos na primária com a quantidade secreta de água para fazer gelatina de morango, que dê um passo em frente. Comecámos a crescer em várias frentes e da clandestinidade conseguimos lancar as vozes da discórdia. O camarada Goucha, com aquele disfarce genial do bigode, foi o nosso Ipiranga no canal do estado.
Goucha abriu o caminho para uma nova geracão. Seguiram-se os nomes franceses, as escolas de coktails, chapéus de meio metro, toucas para segurar o cabelo e cozinheiros carecas. A integracão no reduto do inimigo foi conseguida depois de décadas de luta.
Todos os segredos foram desvendados e o mundo tornou-se um lugar mais justo.
Todos?
Não. Um segredo resiste e resistirá sempre contra o invasor numa pequena aldeia protegida por Toutatis, o deus dos ovos de aviário.
Nesse paradeiro incerto, último bastião da sabedoria culinária, está codificada a receita da omolete no Santo Graal.
Anos e anos de tentativas. Sonhos desfeitos no momento de "dobrar" a omolete. O sorriso de quem está por perto e a humilhacão de comer uma vez mais ovos mexidos.
O Graal era apenas uma lenda, mas as nossas angústias diziam-nos que existia.
Partimos no vento da esperanca.
Passámos desfiladeiros, andámos de liana e desafiámos as leis da Física.
Quando as forcas nos abandonaram uma visão surgiu.
Era Afonso Henriques, ele próprio, sentado a fazer uma paciência enquanto guardava a porta do Graal.
"Altoooo, têm cartão da casa??", perguntou-nos visivelmente irritado.
Esforco inglório. A odisseia presa num detalhe. Calcões e ténis não davam entrada naquela casa.
"Esse aí pode entrar!!", dizia Afonso para James, que depois de 5 dias de pó continuava com o smoking e o cabelo impecávelmente limpos.
James não nos abandonou na porta e tudo parecia perdido. Num golpe de génio, o camarada Indiana lembrou-se daquela história do carpinteiro e do Latim.
Conseguimos entrar!
No limiar das forcas chegámos ao Graal. O Santo Graal estava ali!
Abrimos a primeira página.
Era o índice.
Pág. 45 - Como virar a omolete?
41, 42,43...estávamos impacientes e o suor das mãos colava as folhas.
44,... aguentámos a respiracão...
45 - USE DUAS ESPÁTULAS
5 comentários:
Estou absolutamente fascinada :P
espectaculo eu tambem gostava de as fazer assim beijocas
ana
Caso já não te lembres, para confeccionar uma omoleta, deves bater os ovos com um garfo, apenas sete vezes. A frigideira deve ter um pouco de gordura e o lume deve ser brando. As duas espátulas são a melhor solução para virar e compor a dita. O interior deve ficar cremoso. Mesmo bom,é quando nos chamam e já está tudo feito e pronto a devorar.
Extraordinário Tiago!
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