quarta-feira, outubro 25, 2006

"Manoooooo"

Quando era pequeno, o meu irmão começava quase todas as frases por: "Manoooooo, um dia vamos..."
Invariavelmente eu respondia que sim a tudo. Primeiro porque não sei dizer NÃO e depois, porque sim. Alguns "um dia" ainda estão por cumprir, mas lá chegaremos.
Hoje tenho um "um dia" que me assalta o desejo.
"Um dia" gostava de conhecer um mecânico honesto. Se isto não fosse possível, saltar-me-ia logo outro "um dia" que seria: "um dia" gostaria de conhecer um constructor civil que não roubasse nos materiais.
Entenda-se, não tenho nada contra estas profissões e até as gostaria de respeitar, mas ainda não conheci um único que não roubasse descaradamente.
O constructor civil com nome paga luvas nas Autarquias e ganha concessões. Rouba os contribuintes, ou seja, um pouco a todos nós. O constructor mais "pequenito" engana o pobre desgraçado que vai ao BES pedir um empréstimos a 70 anos e que compra uma casa de papel a julgar que tem cimento.
Mas os mecâââânicos....esses sim, são malta refinada. Em vez daquela placa com ar sério que colocam ao lado do calendário da Gina dizendo: "Não nos responsabilizamos pelos objectos no interior do veículo", poderiam ter uma com: "Vamos gamar tudo o que estiver no carro, mas como temos esta placa aqui, será legal e não te vais poder queixar". Depois há o preço praticado. A hora é paga como se estivessem a investigar o aquecimento global do planeta e naquelas mãos sujas de óleo estivesse a salvação da espécie humana. Por uma vez na vida gostava de conhecer um mecânico que cobrasse exactamente o tempo que trabalha, ou vá lá, não gamasse mais do que meia hora.
Há umas semanas atrás fui fazer a revisão dos 170 000Km. Levei o manual, que em sueco explicava os testes que deviam ser feitos. O mecânico também sueco disse que sim a tudo e que sabia o que fazer. Eu, que percebo quase o mesmo de sueco e mecânica, confiei.
Uma semana mais tarde, parado na autoestrada com a panela de escape partida e a arrastar no chão, percebi que ele me cobrara 40 cts para mudar o óleo e não fazer qualquer teste. Mesmo sendo leigo na matéria, deduzo que se verificasse o carro, dificilmente aquele cromo deixaria escapar uma fenda na panela de escape que parecia o Grand Canyon.
A tira da minha mala e o cinto do meu colega Boliviano seguraram o escape até à oficina seguinte. "Tens sorte", disse ele. "Conheço um brasileiro aqui perto e blá,blá". De súbito fiquei com a sensação que poderia estar a estrear-me na categoria de "mecânicos-honestos". "Que diabo...falamos a mesma língua neste fim de mundo. O gajo não vai ter lata de me gamar!!", pensei.
Mal cheguei, o meu colega apresentou-me ao senhor, que me perguntou: "fala Português?"
Fulminante como um raio, rápida como uma bala e antes que a minha língua batesse no céu da boca, uma senhora disse: "Porrtuguéiz num fálá Porrtuguéiz...Porrtuguéiz fálá Russú!"
Desloquei as minhas duas cavidades oculares para a esquerda, onde uma imagem roliça, caracóis-década-de-80 e carnes a extravasar a elasticidade dos tecidos, me recebeu. Era a "Patroa". Não por trabalhar, mas por ser a mulher do "Patrão".
Ajustes explicados, o "camarada" despediu-se com a frase: "traga dinheiro que eu não aceito cartões". Fico sempre desconfiado quando um gajo que cobra este mundo e o outro, não quer pagar as míseras taxas multibanco e obriga os clientes a levar o dinheiro em alcofas, mas...
No dia seguinte liguei e fiquei espantado com o preço. A peça custara 7 contos e o arranjo pouco mais do que 10. Fiquei radiante. Saltei pela casa enquanto dizia a mim próprio: "Brasileiro! Mecânico!Honesto!" Esta combinação de palavras tinha tanto de utopia que fui a correr, saltando de nenúfar em nenúfar, até ao multibanco mais próximo.
Quando lá cheguei, ainda tinha um sorriso estampado na cara quando vi a factura. Era exactamente o dobro.
Recolhi todos os dentes enquanto lhe disse que ele me tinha dito metade. Porque assim e assado, coisa e tal e troca o passo e por isso o dobro. Eu repeti, dizendo que não havia forma de confundir os dois valores, principalmente quando falo na minha lingua materna. Com toda a lata do mundo, cobrava-me mais de 30 contos por fazer uma solda e apertar dois parafusos. Estávamos a falar de 10 minutos de trabalho no máximo e para os atingir, teria que executar as tarefas com luvas de boxe.
Sentia-me roubado até ao osso. O que fazer? O que se pode fazer numa altura destas? Deixar lá o carro? Gritar e pagar na mesma? O sentimento de impotência nossa e impunidade destes gajos, ainda me atormentava mais o espírito.
Se me apontassem uma arma e me pedissem a carteira sentir-me-ia mais confortável. Pelo menos assumiam.
Mas "um dia" eu sei que vou conhecer um luvas-de-óleo honesto. "Um dia".
"Manoooo, se um dia fores mecânico, prometes que não me gamas??"

14 comentários:

Anónimo disse...

Epá, só de estar a ler isto até ranjo a dentadura com raiva. Epá, se há ladrão sem vergonha é o mecânico e não me venham cá com estórias. E podes crer, é gamar à descarada com a lei a fazer festinhas na cabeça do gatuno.

joaninha disse...

eu sei que a situação e chata mas com os teus comentários e impossível não sorrir ao mesmo tempo que te dou razão! :D

Bjinhux

catarina disse...

(desculpa, mas eu fiquei ali presa no primeiro parágrafo do teu texto: é que eu aprendi a dizer "nao" primeiro do que "sim", por isso dizia nao a tudo... agora que penso nisso, ainda me farto de dizer nao. enfim, feitios...)

(eu podia ajudar-te e fazer passar esse sentimento de "que grande parvo que eu sou"... bastava contar-te como fui "assaltada" por um taxista espanhol, acabadinha de chegar a madrid, a meio da noite, a arrastar as malas no aeroporto de barajas. mas then again, nao me apetece. afinal de contas, ainda és benfiquista:))

Inês disse...

Bem.. O meu bolinhas dá-me problemas todos os meses por isso já conheço todos os mecânicos da região centro e norte. Essa coisa de cair o tubo de escape tb me aconteceu mas só me levaram 5 euros por soldar :P O melhor é tirares um cursinho de mecânica e começares a treinar bricolage, até já és engenheiro e tudo.. não vai custar nada :P e de qualquer forma, fixa isto: todos os problemas dos carros, invariavelmente, têm a ver com a junta da colaça :D

Anónimo disse...

Mano, eu não posso prometer que quando for mecânico não te roube, porque eu não quero ser mecânico, neste momento quero tirar o curso que tou a fazer, e talvez "um dia" siga para a universidade ou senão vou trabalhar!
Outra coisa, tu estás sempre a mandar vir comigo, devido as falhas de ortografia, tu no teu pequeno texto, escreveste autoestrada, mas escreve-se auto-estrada. Esta é a primeira, outra que reparei, e acho que um bom português deve pronunciar bem a sua língua materna, e florença se tiveres a ler este comentário só te queria relembrar que se escreve histórias e não estórias. :)
Mano um beijo grande, quero que continues o bom trabalho que estás a desempenhar na Suécia, e podes falar sobre mais assuntos que eu venho aqui ler e comentar se possível. Um beijo e abraço deste teu mano(chato) Gonçalo Pereira de Oliveira []*

Tiago Franco disse...

Gonçalo,
antes de mais, fico contente que escrevas por aqui :)
Fico ainda mais feliz por saber que nas 821 palavras que escrevi encontraste um erro. De facto tens razão. "Auto-estrada" é o termo correcto e esse olho de lince mostra que as minhas "embirrações" serviram para algo.
Contudo, tenho que te pedir que vás até:

http://www.infopedia.pt/E2.jsp

e escrevas "estória".
Encontrarás a seguinte explicação:

"substantivo feminino

história de carácter ficcional ou popular; conto; narração curta;"

O que a Florença queria dizer era algo do género:
"Não me venham com tangas", sendo que "tanga" não seria uma cueca fina.
Quanto ao resto, concordo em absoluto e também acho que devemos falar correctamente a nossa lingua materna. Não sendo um dicionário vivo, tento honrar o poeta (o Camões) e não cometer muitas gralhas. Espero que faças o mesmo.Caso contrário...chateio um pouco mais, porque já vi que resulta.

Anónimo disse...

Ouve lá, porque não regressas ao passado e compras uma DT? J´s deves conhecer as 1500 peças da mota!

Tiago Franco disse...

Manso:
1. Chove metade do ano e o frio dura pelo menos 9 meses :)

2. Mesmo numa DT mal percebia onde ficavam as rodas!

3. Depois, não faz sentido exercer uma profissão extra, só porque os titulares da mesma são desonestos. Qualquer dia tenho que fazer o meu próprio prédio, conduzir o meu próprio táxi, votar em mim para o parlamento e abrir um estaminé de bate-chapas, para não necessitar de "servicos" onde sei que me vão enganar...

Sociedade séria e honesta, para compromisso de vida, é o que se pretende :)

Anónimo disse...

Gonçalo,

O Tiago escreveu por mim e agora só me resta desejar que não sigas para mecânico senão eu vou mesmo chamar-te muitos nomes feios e em mau português :P

Anónimo disse...

Tive de dizer um disparate para me levares a serio!

Podão!

Em relação aos mecanicos, nunca hei-de perceber a razão das aldrabices a que estamos sujeitos.

Quanto á auto-suficiencia, já reparaste na tendencia actual para que cada vez mais sejam os próprias pessoas a fazer o que antes ninguem se deixava para os bicateiros? Pintar, colar, envernizar, polir, montar moveis do IKEA...

Anónimo disse...

Isto não dá para editar. Aquele "ninguem" está ali a mais.

Tiago Franco disse...

Manso:
não vale a pena editar. No meu cérebro está um tradutor calditano-português que me ajuda no teu caso :)
O IKEA é a seunda maior invencão do mundo, depois do penteado do Paulo Bento :)

Anónimo disse...

Cuidado com os calditanos!

Estamo-nos a reproduzir como coelhinhos!

Depois da geração 1975-76-77 está para vir a geração 2006-07!

Até o Chico vai ser pai!

PS: Ri-te com isto:

http://cabelinhoapaulobento.blogspot.com/

Anónimo disse...

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