quinta-feira, setembro 21, 2006

"Nice, very nice"

Um colega faz amanhã 50 anos.
É simpático, educado, dos poucos que não tira comida dos dentes e mede, sem exagero, 3 metros e meio.
Segundo as regras da empresa, qualquer empregado tem o direito de folga no seu 50ö aniversário, pelo que o departamento resolveu promover um almoço de convívio na véspera. Hoje.
Acabo de chegar de lá.
É impressionante como um simples almoço pode ser uma mistura de Circo Chen com o Avante.
Começo pelo fim.
Não há "parabéns a você, nesta data querida...lálálálá". Levantam-se e em uníssono cantam algo parecido com "Avante camarada, avante...junta a tua à minha voz". Não percebi a letra, mas a música agradou-me. No fim fazem um grito viking que me soou a :"Hurra, Hurra, Hurra, Hurra, Hurra" e por momentos pensei que fossem invadir a mesa vizinha e sequestrar todas as doses de alfafa com molho.
Quando me aproximei da mesa, reparei que ao meu lado estava sentado o gajo mais estranho que habita neste quilómetro quadrado. Para quem viu o filme "melhor é impossível", onde o J.Nicholson interpretava uma daquelas pessoas que mete os pés só em determinados quadrados do passeio enquanto se deslocam (sempre os queria ver num passeio de calçada portuguesa), é exactamente um desse clube que estava ao meu lado.
Só que ele não o faz apenas com os pés. Faz com tudo.
Tenho que fazer um parêntesis...
(...)
Já tinha reparado, que no refeitório ele demorava mais ou menos 2 horas a almoçar, dividindo o tempo da seguinte forma:
- olhar para o menu (10 min)
- no buffet da salada, meter a colher na taça da cenoura raspada e tirá-la ainda vazia. Repetir esta acção 5 vezes. (5 min)
- olhar para a sala e escolher uma mesa (5 min)
- deslocar-se até essa mesa (10 min)
- uma vez na mesa, puxar a cadeira e olhar para ela. Não sentar...apenas olhar. (10 min)
- uma vez sentado, ajeitar o garfo e a faca, raspando-os um no outro. Ajeitar também o prato, o copo, o guardanapo e a boca. (5 min)
- com tudo aparentemente pronto para comer, inicia-se a minha parte preferida. Ajeita a cadeira e anda com ela para trás a para a frente até estar bem encaixado (10 min)
- enche um garfo de comida, levanta-o e olha para ele. Despeja alguma de volta para o prato. Repete isto 3 vezes e com o garfo praticamente só com inox, coloca-o na boca. (5 min)
- repete este processo 157 (a diferentes velocidades) vezes e vê o fundo do prato.(60 min)
- levanta o guardanapo e olha para ele. Limpa a boca de um lado para o outro e volta a olhar. Repete isto 7 vezes e com a boca bem limpa, levanta-se dando por concluída a refeição. (10 min)
(...)
Voltando ao assunto....
Estava este personagem a encher o prato à minha frente e eu preocupado. Só tínhamos 1h para comer. Ele nem ia conseguir chegar a sentar-se...
Depois, queria aguentar-me sem rir. Manter a pose de estado. Mas nestas coisas, quanto mais me seguro, pior é. Aguentei na salada, aguentei nos talheres, mas quando ele começou a balançar a cadeira, um suor frio percorreu-me a espinha e soltei uns sorrisos idiotas. Arranjei uma tanga qualquer para não parecer mal....aiiiii, este gajo dá-me cabo da pose de "gentleman".
Entretanto, a mesa encheu-se de silêncio. Não brincam em serviço quando toca a dar ao dente. Eu não suporto silêncio numa mesa, mas não sabendo a língua não conseguia quebrá-lo. Em todo o caso, esse problema não existiu. De garfo em riste (apenas garfo, não há cá mariquices de facas!!), começaram violentamente a castigar os pratos, fazendo-os gritar até à exaustão. Foi um autêntico recital de louça, um star wars sem jedis, um combate de INOX versus IKEA. Todos riscados e em chamas, os pratos agradeceram quando ficaram vazios.

Eu tenho o péssimo defeito de comer depressa. Sei disso.
Senti-me um pouco melhor hoje. Fui o penúltimo a terminar (o gajo do lado ainda estava a mirar o garfo) e perto deles parecia que tinha crescido na corte de Luis XV. O viking que se sentou à minha frente não demorou mais do que 2 minutos a levantar a cabeça (sinal que já acabou de comer), mas ao olhar para ele percebi que não estava totalmente satisfeito. A cereja, faltava a cereja.
Eis senão, quando coloca o dedo na boca e com algum custo retira umas boas gramas de carne de porco. Satisfeito, olhou para elas e sorveu-as como se não existisse amanhã. Agora sim, estava a refeição concluida.
Já perfeitamente controlado e com os sorrisinhos parvos guardados na gaveta, resolveram fazer circular na mesa a prenda que o departamento havia comprado.
Era uma belo fio de prata. Grosso, bem grosso e reluzente. Já tinha visto barcos presos com fios mais finos. Voltei a fazer das tripas coração e deixei apenas 3 dentes de fora, segurando os outros, enquanto dizia : "Nice...very nice".

5 comentários:

Sandrinha disse...

Eu ri mesmo á gargalhada!

Hilariante!!

Rapaz, tu deves ter uma costela do "super homem" para conseguires aguentar sem rir!
Um fio de prata!! É maravilhoso!

NUVEM disse...

Olha ke eu nao tava nesse almoço e fartei de rir só com o teu texto... se eu tivesse lá partia-me toda a rir e ke kuanto mais me seguro e vou imaginando as cenas pior é...
Nice post ;o) Adorei.. Tens mt humor... Beijinho Grande fica bem :d

marília disse...

Sou uma lástima nestas coisas. Ou sai comidinha disparada pela boca, ou engasgo-me toda a tentar controlar o riso e sai comidinha disparada também...mas pelo nariz! :(

Treis disse...

Adoro ler-te...

Fazes-me rir... e é o que preciso!

Obrigada

Tiago Franco disse...

Quem n precisa de um bom sorriso :)
Obrigado pela visita :)